domingo, 23 de outubro de 2011

Semana negra



Paixão. Ela move o ser humano a fazer coisas que são contra sua natureza instintiva de sobreviver a cada dia. Corridas de carro e moto se encontram classificadas aí – ou alguém vê algum sentido em dar voltas em círculos durante mais de uma hora a 300 Km/h?

Posso dizer por mim, que se tivesse condições para ingressar numa destas modalidades quando era menor, não titubearia. Iria cheio de vontade e aprenderia a não pensar em riscos – que é o que fazem os pilotos, anestesiam dentro de suas cabeças quaisquer riscos que por ventura o esporte a motor possa trazer. Seria como se você visse acontecendo com os outros e se achasse super protegido por não ser com você; algo como uma aura diferenciada.

Sabemos que não é assim.

Sinceramente, nunca fui muito fã de Dan Wheldon. O inglês - mesmo sendo inglês - não andava bem, não importa a circunstância, em circuitos mistos na época que dirigia para Andretti-Green e Chip Ganassi. Pensava em Dan como um cara de sorte, que esteve no lugar certo na hora certa. Venceu uma vez as 500 milhas de Indianápolis e um campeonato que, na minha opinião, teve muito de sorte nos momentos chave.

Wheldon vinha tendo um 2011 de sonho. Liderou uma volta da Indy 500; a que importava. A volta que lhe concedeu sua segunda visita ao Victory Lane de Indianápolis. A volta que guinou sua vida. Graças àquela volta, Dan atingiu o status pela mídia de gênio subestimado (pra mim, mais subestimado do que gênio). Ganhou de presente desenvolver o chassi 2012 da Indy, o que lhe colocaria certamente em alguma equipe séria na próxima temporada.

Faria as duas últimas corridas do ano como uma estrela - principalmente a última, onde, se ganhasse, faturaria cinco milhões de dólares a serem divididos com um torcedor. A história de uma decisão de campeonato com os dois postulantes largando no meio do grid e Dan saindo de último numa “missão impossível” de vencer parecia ser um clássico. Não foi... muito pelo contrário, como já sabemos há uma semana.

Marco Simoncelli vinha tendo um ano bom também. Duas pole-positions e dois pódios; sendo piloto de equipe privada na MotoGP atual (embora tivesse uma Honda dita oficial), são feitos notáveis. Feitos que também se deveram a seu arrojo excessivo e falta de responsabilidade em alguns momentos. Os mais famosos deles: Em Le Mans, quando Pedrosa fraturou seu ombro numa fechada de Marco; e em Assen, quando na primeira curva pra esquerda (lado frio do pneu, já que as quatro primeiras são para a direita) errou e abalroou Jorge Lorenzo – alguém com quem Sic já estava tendo atritos fora da pista desde o fim do ano passado.

Desde essa corrida na Holanda, Marco parecia ter domado seu ímpeto. Seu primeiro pódio na República Tcheca e seu segundo na última corrida em Phillip Island, depois de uma disputa com seu rival de longa data, Andrea Dovizioso, parecia que abriria de vez a porta para uma iminente primeira vitória. Seu contrato com a Gresini foi estendido em mais um ano, junto ao patrocínio da empresa italiana alimentícia San Carlo. Simoncelli também teria no ano que vem uma Honda de fábrica. Parecia entrar no clube dos grandes. Até mesmo por seus atos, já que, contra a vontade da Honda, insistiu em permanecer com a mesma equipe de mecânicos desde seu começo na 125cc, no lugar de um time novo, vindo da fábrica japonesa.

Sepang já era um circuito de muita simbologia para ele. Foi lá, durante a pré-temporada de 2010, onde sofreu seu pior acidente da vida até então. Caiu e rachou seu capacete. Foi colocada em dúvida sua participação no início do ano. Mas Sic deu a volta por cima e provou que, sendo campeão das 250cc em 2008 (título conquistado também na Malásia), este seria o menor dentre seus desafios.

Hoje, lá em Sepang, Marco encontrou o destino (não, não tem outra palavra). Quarto colocado, numa disputa de tirar o fôlego com Álvaro Bautista, saiu de frente na saída da curva 11, e, tentando arremeter - depois de ser ultrapassado pelo espanhol e por Nicky Hayden - teve seu corpo (apenas o corpo, não a moto) acertado em cheio por Colin Edwards e Valentino Rossi.

Assistir ao vivo algo dessa forma é algo muito chocante. Fui dormir, e acordei com a notícia. Sinceramente, você pensa em não assistir mais às corridas... mas logo lembra a que dedicou praticamente sua vida inteira amando. F1 veio de berço, mas MotoGP veio com a idade e este jogo. Vi a morte de Daijiro Kato em Suzuka em 2003, vi a de Shoya Tomizawa em Misano em 2010. Por mais que tenha sido forte nessas ocasiões, dessa vez foi diferente. Admirava Marco, torcia e até, de certa forma, me identificava com ele, seu estilo... e porque não, seu cabelo (até Julho, rs).

Acabei decidindo, enquanto escrevia esse texto, que vou continuar assistindo às provas. Tenho certeza que só assim vou conseguir passar por isso – lembrando pelo quê assisti e vibrei nesses últimos nove anos como apaixonado pelas corridas de moto.

De qualquer forma, duas mortes em uma semana em nossas vidas automobilísticas; caras que víamos há muito tempo dividindo freadas, vencendo, batendo e perdendo. Conhecidos nossos há algum tempo... gente que recebíamos em casa, por assim dizer.

Estou sentindo como se realmente tivesse perdido dois parentes. Que o tempo console estas perdas... que sigamos em frente... embora agora seja difícil, confesso.
Non si scorda mai, mentre io vivo, Marco. Addio.
Mensagem por celular de Marco a Dani Pedrosa em razão do acidente na França. Como disse TK depois de postar uma foto junto de Wheldon, "é assim que devemos lembrar dele".

Um comentário:

Ron Groo disse...

Uma semana pra não se esquecer jamais, afinal, não se esquecem heróis. Por nada.